segunda-feira, 8 de abril de 2013

“A Criação em Cativeiro de Animais Selvagens” 0.2

O Animal no Direito                                                                                                          
A classificação jurídica do animal nunca foi isenta de problemas. Nem persona nem totalmente res, os animais acabaram classificados por defeito como res, objectos de direitos. Se não podiam ser considerados pessoas só podiam ser considerados coisas.        
Como coisas, antes da aquisição, seriam res nullius, coisas sem dono? No direito romano, do Digesto, parece ser a resposta negativa., pelo menos no geral. No direito medieval e moderno, a resposta continuará a ser negativa, assumindo os animais sem dono a categoria de regalia (autorização ou concessão real), muitas vezes por associação á propriedade da terra onde os animais habitavam, mesmo os animais para caça ou selvagens.      
A equiparação do animal á coisa não significa que seja o animal prefigurado como coisa. Os animais aparecem pois como um “espinho” na dicotomia clássica, resolvida com a inserção imperfeita dos animais na categoria das coisas inanimadas. A aquisição e utilização de animais para primeiro assegurar a sobrevivência e depois para diversos fins mais específicos como a alimentação ou a transporte parecem ter justificado pois a equiparação.                                                                                                   
A classificação jurídica dos animais sempre conviveu com ideias morais, filosóficas e literárias sobre a necessidade de proteção dos animais. Regras jurídicas também foram formuladas, se bem que com pouca consagração e aplicação, desde a Antiguidade. Já a partir do século XIX, na sua primeira metade, o direito positivo efectivo começou a tutelar os animais.                                                                        
Esta proteção começou como um meio de conseguir e proteger benéficos económicos futuros, e não como um fim em si mesmo (exemplo da Convenção de Paris de 1902). Após a 2ª Guerra Mundial, o paradigma mudou, passado a ser a proteção dos animais, os selvagens em especial, um fim em si mesmo (exemplo do Convenção de Paris de 1950, que veio substituir a de 1902).                                                                                
Com a Declaração de Estocolmo de 1972, especialmente no princípio 4, tornou-se a proteção dos animais selvagens um fim específico, sendo que com a Convenção de Berna de 1979 ou a de Washington de 1973, este fim assumiu carácter global. Passou a haver até consagração constitucional e internacional dos direitos dos animais, de onde é de destacar a Declaração Universal dos Direitos dos Animais de 1978. Todavia sendo a proteção dos animais, de natureza pública, a classificação civilista contínua eficaz.       
Contudo em certos países europeus, já começaram a ser inseridos nos Códigos Civis certos especificidades em relação aos animais, não os classificando como sujeitos de direito mas concedendo-lhes uma proteção especial. Exemplos desta nova realidade são o artigo 285º do Código Civil Austríaco, o artigo 90º do BGD, alterado em 1990, e o artigo 641 º do Código Civil Suíço, alterado em 2003. Uma solução idêntica para o ordenamento jurídico português parece-nos uma opção acertada, não considerando os animais como pessoas, é possível dar-lhes um conjunto de direitos especiais que tem origem na sua dignidade, enquanto seres vivos.

O Animal no Direito do Ambiente                                                                                   
Nas últimas décadas do século XX emergiu, como novo ramo de Direito, o Direito do Ambiente. Ainda que não nascido isento de discussão sobre a sua autonomia jurídica e escopo, parece ser hoje mais assente a sua relevância e emancipação. Partindo de uma ecologia social, um antropocentrismo ecológico, superando a discussão entre antropocentrismo e ecocentrismo, sendo os animais, a fauna, parte da natureza, devem integrar o objecto do Direito do Ambiente.                        
Ainda que pareça ser na ordem jurídica portuguesa, com base na Lei de Bases do Ambiente, que um concepção ampla de ambiente foi a adoptada para o legislador português, mesmo seguindo um noção restrita de ambiente, como Carla Amado Gomes, é de incluir sempre aí os animais selvagens, como bens ambientais naturais (bens naturais, cujas qualidades são susceptíveis de fruição colectiva (artigo 16 e 6 f) da Lei de Bases dos Ambiente). Quanto os animais domésticos, a questão parece ser mais espinhosa, mas este estudo não pretende discutir esse tópico.

O Animal Selvagem no Direito do Ambiente                                                                              
O homem é um animal, no termo biológico do termo. Com origem latina, a palavra animal liga-se com a ideia de sopro vital. Fauna, outro conceito relevante, é o conjunto de animais de uma determinada área. O reino animal é constituído por todas as faunas. A fauna pode ser classificada de várias formas, a mais relevante é entre:             
Fauna Doméstica – espécies que foram submetidas a um processo tradicional de utilização pelo homem, possuindo características morfológicas e comportamentais originárias dessa utilização e selecção artificial, em estrita dependência do homem para a sua sobrevivência, categoria onde se inserem os animais de companhia;                         
Fauna Selvagem – espécies não domésticas (não tendo pois sofrido modificações pela selecção artificial feita pelo homem em razão das características mais relevantes para a utilização do animal), cuja existência é livre e independente do homem (facto curioso, no Brasil, ao que parece por razões de conotação negativa associada á palavra selvagem, usa-se o termo de animal silvestre.                                                           
A classificação bipartida acima indicada não é isenta de discussão. Dentro da fauna selvagem é possível a distinção entre fauna selvagem nativa, espécies naturais de um determinado território onde estão inseridas e onde se insere a fauna migratória e por outro lado a fauna selvagem exótica, espécies não nativas de um determinado território, introduzidas pois pelo homem. Os motivos para essa introdução são variados, mas as consequências para os ecossistemas são sempre bastante perigosas.                                                  
O elemento mais problemático são pois os animais objecto do presente estudo, os animais selvagens em cativeiro. Um possível critério seria a ferocidade do animal, contudo tal critério parece falhar redondamente face a realidade. Um animal não passa a doméstico por perder a sua ferocidade, como se percebe pelo exemplo da abelha ou do touro. Este exemplo do touro não inocente, o facto de este ser um animal doméstico é razão para o excluir do estudo.                                                                                       
Um critério baseado no facto de estar o animal em liberdade ou não falharia pois como se compreende não foi o animal que abdicar da sua liberdade. O facto de estar em cativeiro não é motivo para lhes retirar a tutela de animal selvagem, mesmo se nascidos em cativeiro. Essa tutela também não é motivo contudo para proibir a criação em cativeiro de animais selvagens, essa tutela é apenas uma forma de garantir as condições mínimas desse cativeiro, que terá sempre de ser justiçado.                                                   
O facto de o animal estar em cativeiro, tido como propriedade e limitado na sua liberdade por regra como se fosse um animal domestico não faz dele um animal doméstico, antes um animal domesticado ou semisselvagem. Estes animais convivem com o homem, dele dependem para a sua sobrevivência, tem as características dos exemplares selvagens, podendo até ser devolvidos á natureza após um período de adaptação ao seu habitat natural. Se o animal já não conseguir voltar a ser reintroduzido, se perdeu a sua capacidade de viver na natureza, então passou já a linha divisória, passou a animal doméstico. O objecto deste trabalho é pois a Fauna Semisselvagem, animais selvagens em cativeiro.                                                                                          
Preferimos o termo semisselvagem ao termo domesticado pelo simples facto do critério distintivo entre selvagem e doméstico ser pois o da sua capacidade de viver na natureza, um animal selvagem em cativeiro, poderá sempre voltar para a natureza. Parece ser este o entendimento do legislador no artigo 2º b) do DL nº 276/01 de 17 de Outubro, ao classificar como selvagens todos os espécimes de espécies selvagens, em liberdade ou em cativeiro. Assim se percebe a redundância da definição. O animal semisselvagem é ainda selvagem, se não é livre é contra a sua vontade, se podermos falar de vontade para os animais, ainda que nos me parece sempre viável falar em vontade para os animais, uma vontade primária e instintiva, mas ainda assim vontade.

O Animal Selvagem em Cativeiro no Direito do Ambiente
A criação de animais selvagens em cativeiro é uma concretização de um dos princípios pilar do Direito do Ambiente, a utilização sustentável e racional dos recursos (artigo 3ºb) e artigo 4ºd) da Lei de Bases do Ambiente). Este princípio é uma expressão de um constante luta entre os benéficos e prejuízos da utilização dos recursos e pela introdução de uma variável economicista no Direito do Ambiente não desperta muita simpatia a muitos juristas do Direito do Ambiente. Com base na Convenção-Quadro sobre Diversidade Biológica, assinada no Rio de Janeiro em 1992, e na sua transposição para a ordem jurídica portuguesa pelo DL nº 21/93 de 29 de Junho, se percebe que a utilização da fauna terá sempre de ser sustentada.
A diversidade animal é uma das bases da estabilidade dos ecossistemas, pois quanto maior a diversidade animal maior é, em principio, o equilíbrio e segurança do ecossistema. Se retirarmos uma peça do puzzle o ecossistema poderá deixar de funcionar em conformidade ou até desaparecer. Isto é, os recursos da fauna devem ser utilizados de modo a que a longo prazo não haja a diminuição da mesma diversidade (artigo 2º da Convenção-Quadro sobre Diversidade Biológica).
Esta convenção sugere como formas de conservação da fauna, a conservação in situ (a manutenção e recuperação das populações amimais nos seus habitats naturais, com a proteção dos habitats naturais como condição essencial, normalmente conseguido com a criação de áreas protegidas, artigo 8 º da Convenção-Quadro sobre Diversidade Biológica) e a conservação ex situ (artigo 9º da mesma Convenção).                       
A conservação ex situ, fora do seu habitat natural, pode pois ser conseguida com a criação do animal em cativeiro, com o objectivo de introduzir os amimais no seu habitat natural original ou num novo habitat natural. Não esquecer que as principais causas a levar á diminuição dos ecossistemas são a destruição ou diminuição dos habitats naturais, a poluição, a introdução de espécies selvagens exóticas (DL nº 565/99 de 21 de Dezembro sobre a introdução na natureza de espécies não nativas) e captura de animas selvagens, todas causas de origem humana portanto.

O Cativeiro                                                                                                                        
A conservação da fauna selvagem fora dos seus habitats naturais, é realizada por meio dos criadouros.  Os criadouros são as áreas limitadas e cercadas dotadas de instalações para a criação, o desenvolvimento ou a reprodução da fauna selvagem, no fundo o cativeiro propriamente dito. É
preciso pois classificar pois o cativo conforme o seu fim específico e principal:

Conservação
É todo o empreendimento com finalidade primeira de criar, recuperar, reproduzir e manter animais selvagens em cativeiro para realizar programas de conservação. O objectivo final deste tipo de cativeiro será a reprodução ou reintrodução do animal no seu habitat natural (definido no artigo b) da Directiva 98/43/CEE do Conselho de 21 de Maio).
A Directiva 98/43/CEE do Conselho de 21 de Maio (Directiva Habitat) permite este tipo de cativeiro, sempre em condições estritamente controladas. Por Portaria do Ministro do Ambiente e Ordenamento do Território é regulada esta matéria, segundo o artigo 17º do DL nº 140/99 de 24 de Abril. Em relação às espécies para caça há ainda o DL 202/04 de 18 de Agosto sobre a conservação, fomento e exploração dos recursos cinegéticos.

Científico
É todo o empreendimento cuja finalidade última é a realização de pesquisas científicas e de ensino, para suportar investigações, e inclusive o desenvolvimento de técnicas para a reintegração de certas espécies na natureza. Este tipo de empreendimento está autorizado em Portugal pelo DL 140/99 de 24 de Abril nos seus artigos 15º e 20º e também pelo DL 202/04 de 18 de Agosto para a caça.
A utilização de animais para fins científicos, apresente sempre muitos problemas, no estabelecimento dos seus limites (artigo 16º1 da LBA e 2º da Convenção de Berna). Quer selvagem quer não, a DUDA no seu artigo 8º a), condena a experimentação animal que implique sofrimento ao animal.

Comercial
Este cativeiro tem como fim a comercialização dos animais, partes, produtos e subprodutos destes animais selvagens. Esta é uma actividade especialmente controlada, sendo em geral proibido o comércio de animais selvagens, com a excepção destes criações devidamente autorizadas.
Se bem que não nos pareça bem o comércio de animais selvagens, é preferível a sua comercialização através de criadoiros que a sua retirada da natureza, pondo em causa ecossistemas em funcionamento. O problema não é pois o comércio, mas sim o comércio ilegal e descontrolado, o tráfico enfim.
Com a Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção (CITES) de Washington de 1973 se estabeleceu as condições para este comércio legal, tudo o que se processe fora das condições desta Convenção será considerado tráfico. O DL nº 114/90 de 5 de Abril, regulamentada actualmente esta Convenção em território português, em ligação como a politica comunitária nesta matéria. É também de referi o artigo 278º 2 do Código Penal Português, no Crime de Danos contra a Natureza, onde parece se incluir o crime de tráfico.

Consciencialização
Por fim, tempos pois os jardins zoológicos em geral, com colecções de animais selvagens vivos em semiliberdade ou em cativeiro, para a visitação pública a fim de atender a várias finalidades (cientificas, conservacionistas, didácticas). Estes desempenham um papel fundamental na conservação das espécies, também abrangem acções de recuperação de animais mas é mesmo a sua função de despertar consciências a mais premente, alertando o grande público para os problemas das espécies e do ambiente.
Estes são regidos em Portugal pela Directiva 1999/22/CE do Conselho de 29 de Março, em seguimento da Convenção sobre Diversidade. Esta Directiva foi transposta para o ordenamento jurídico português pelo DL nº 59/2003 de 1 de Abril. Para um animal selvagem estar no jardim zoológico é preciso que estejam asseguradas as condições mínimas e que o animal se adapte ao cativeiro. O jardim zoológico deve informar sobre as actividades de investigações que leva a cabo, devendo o cativeiro estar dispostos de forma impedir a sua fuga, e sempre com registos actualizados. É sempre preciso uma licença da Direcção Geral Veterinária, estando sujeitos a inspecções.
           
A Tutela Jurídica
A Constituição da República Portuguesa de 1976, no seu artigo 9º d) e e) institui como tarefas fundamentais do Estado a proteção do natureza e do ambiente e a conservação dos recursos naturais, dos animais selvagens incluindo. O artigo 66º da CRP, consagrando pois o ambiente com um direito fundamental, refere no seu número 2 alínea d) o aproveitamento racional, e sustentável pois, dos recursos naturais. Desta norma se parece reconhecer que a proteção dos animais selvagens não se prende apenas com a sua utilidade económica para o homem, mas antes é um objectivo intrínseco, a conservação da fauna é um fim em si mesma.
É muito relevante a Declaração Universal do Direitos dos Animais, proclamada pela UNESCO no dia 27 de Janeiro de 1978. Começando por considerar que cada animal, individual, tem os seus próprios direitos, e reconhecendo o perigo de o homem levar a cabo genocídios (assim definido no artigo 12º) das espécies animais do planeta, o artigo 1º consagra o direito á vida de todos os animais. No seu artigo 2º b) refere que o homem não tem o direito de usar os outros animais, e no artigo 3º b) que sendo necessária a morte de um animal deve esta ser instantânea e sem dor. O artigo 4º é muito relevante, referente ao direito do animal selvagem á liberdade, condenando a privação de liberdade seja qual for o motivo.
O artigo 8º é referente é experimentação animal, desaprovando este tipo de actividade se implicar sofrimento para o animal. O artigo 10º, sobre o aproveitamento de animais para o divertimento do homem, proclamou ser esta situação contra a dignidade do animal. Ainda no artigo 14º, se afirma que os direitos dos animais devem ser definidos por leis, como os direito do homem, parecendo ter consagrado, pelo menos em parte, as opções legislativas agora seguidas pelos já referidos códigos civis austríaco, alemão e suíço.
Em Portugal, a Lei n.º 11/87, de 07 de Abril, a Lei de Bases do Ambiente, pois coliga a política ambiental em Portugal, com o objectivo claro do artigo 2º número 2. Abrangendo componentes ambientais humanos e naturais e logo uma visão ampla de Direito do Ambiente, no seu artigo 6º estabelece a fauna como um componente natural. Especificamente, no artigo 16º estabelece a proteção e conservação da fauna como tarefa ambiental do Estado, e em especial no artigo 4º e) e 16º 3 b) se estabelece também a proteção e conservação dos habitats naturais da fauna.           
Destas normas e artigos também se despende que o objectivo será sempre a proteção dos direitos das pessoa ao ambiente, e não os direitos dos amimais. É também de referi o facto de ser esta Lei de Bases do Ambiente de parca aplicação prática, talvez também pela sua desactualização face á realidade sempre em movimento do direito do ambiente.                               
Cabe aqui uma nova separação dás águas, tendo em conta o tema deste estudo. Não falarmos aqui da caça, tema amplo, pois apesar de se tratar de uma actividade humana de captura e abate de animais selvagens, estes só sãos caçados se incluídos numa lista própria, se inserido numa área própria e durante um período próprio (Lei 173/99 de 21 de Setembro, Lei de Bases Gerais da Caça) pelo que não são espécies selvagens em cativeiro e logo fora do nosso estudo.
É contudo relevante referir o artigo 27º, referente á criação de espécies cinegéticas em cativeiro (não esquecendo a definição de recursos cinegéticos do artigo 2º a) da referida lei). Esta criação de animais selvagens é feita em cativeiro, logo é relevante para presente estudo. É de referir que pelo artigo 27º 1 e pela própria natureza da actividade, a caça, a função desta criação tem fins económicos. Não se concorda com todos os fins referidos no artigo, como produção de peles por exemplo, mas é preferível criar animas selvagens em cativeiro para assegurar estas actividades, que capturar animais selvagens em liberdade, retirando-os do seu habitat para esta mesmas actividades, afectando os animais caçados com também todo o ecossistema.      
Além de que actividade de criação em cativeiro de animais como recursos cinegéticos carecerá sempre de um alvará, pelo artigo 27º2, logo se operando alguma fiscalização sobre este tipo de actividade. De qualquer forma, A causa de aquisição de um animal selvagem na caça no direito português será o achamento, ou a ocupação em sentido lato (artigo 1319º do Código Civil). A ocupação de animais selvagens apenas é permitida em relação á fauna cinegética, e nos termos da lei de Bases da Caça e lei regulamentares.   
As Áreas Protegidas, enquanto formas de conservação in situ (sendo que os animais selvagens nessas áreas estão em liberdade), estão também excluídas do presente estudo (DL nº 19/93 de 23 de Janeiro sobre Rede Nacional de Áreas Protegidas, Convenção de Berna de 1979 sobre a Vida Selvagem e os Habitats Naturais na Europa, regulamentada em Portugal pelo DL nº 316/89 de 22 de Setembro, e pelas Directiva 79/409/CEE, sobre a conservação das aves selvagens, e Directiva 92/43/CEE relativa á preservação dos habitats naturais e da fauna e flora selvagens, transposta para o ordenamento jurídico português pelo DL nº 140/99 de 24 de Abril).
O DL nº59/2003 de 1 de Abril, que regulamente os jardins zoológicos começa no seu preâmbulo por expor a história da transposição para o ordenamento português de Directivas e Convenções Internacionais sobre a proteção da diversidade e da fauna e flora selvagens. Este Decreto-Lei transpôs para a nossa ordem jurídica a Directiva 1999/22/CE do Conselho, de 29 de Março, relativa á detenção de animais da fauna selvagem em jardins zoológicos, sobre o licenciamento e inspecção dos mesmos, sobre a manutenção de animais nestes jardins, a formação do pessoal e a educação dos visitantes. Atendendo que a criação de regras efectivas é necessário para que este tipo de estabelecimento cumpra as suas funções, a Directiva começa por no seu artigo 2º definir o que é um jardim zoológico ou semelhante. Logo neste artigo somos confrontados com a exclusão da aplicação desta Directiva aos circos, lojas de animais de estimação e outros estabelecimentos. A Directiva isenta este tipo de instituição pelo facto de não terem um número significativo de animais.
Não nos parece correto, não é o facto de uma instituição ter menos ou mais animais que faz com que o tratamento dos animais tenha de ser diferente, é o facto de serem animais selvagens ou não. É necessária pois uma regulamentação eficaz para este tipo de actividade. Continuando, a Directiva trata depois dos requisitos do licenciamento da actividade e da respectiva inspecção. É de notar ainda que a transposição da Directiva só ocorreu após o limite traçado pela mesma para o efeito, 9 de Abril de 2002, talvez demonstrando a falta de vontade do Estado Português, talvez só a sua preguiça. Já no Decreto-Lei propriamente dito, no artigo 2º nos é dado um critério quantitativa sobre a quantidade de animais para ser abrangido pelo Decreto-Lei, mais de 150 espécimes, pertencentes a espécies não ameaçadas de extinção e não perigosas. O artigo 5º trata extensivamente das licenças para manter este tipo de empreendimento, o artigo 7º sobre os requisitos deste tipo de actividade e sua regulamentação, que serão fiscalizados pela Direcção Geral de Veterinária e pelas Direcções Regionais de Agricultura.                                 
Sobre o aquisição dos animais selvagens para estas instituições, é de muito interesse o artigo 16º, sendo que este apenas pode ser efectuado entre instituições abrangidas pelo âmbito de aplicação deste diploma, se fora destas intuições é necessária a autorização da Direcção Geral de Veterinária, Se faltarem estas condições, estamos perante uma contraordenação punível com coima cujo montante mínimo é de 500 euros e o máximo de 3740,98 euros, segundo artigo 21º. Assim, pelo menos os jardins zoológicos não contribuem para a captura ilegal de animais selvagens. Concluindo sobre a figura dos jardins zoológicos, estes parecem-nos pela sua extensão de regulação e condições exigidas para manterem as suas colecções, pelo facto de atenderem a diversos fins relevantes com a criação de animais selvagens em cativeiro, a melhor forma de manter estes animais longe dos seus habitats naturais na natureza, sendo sempre melhor quando é conseguido o devolver dos animais aos seus habitats. Poderemos dizer que são um mal necessário. Não podemos contudo esquecer que este tipo de normas só é aplicável dentro da União Europeia, logo existem diversos exemplos de condições degradantes no cativeiro de animais selvagens e no seu tráfico abundante e incontrolado, mesmo em jardins zoológicos, pelo mundo fora. A melhor arma contra esta realidade nos parem as acções de consciencialização das populações.
Nos parece vital não confundir a função didáctica que os jardins zoológicos e semelhantes executam com uma função de cativeiro de animais selvagens, e domésticos, para espectáculos comerciais. Indo além dos exemplos mais extremos da luta de galos, cães ou até das touradas, para um exemplo que envolve directamente animais selvagens e que é bastante efectivo na nossa sociedade, os circos, espectáculos, exposições ou manifestações similares. Havendo diversas legislações europeias e não só que chegam a criminalizar a utilização desregulada de animais em espectáculos, a legislação portuguesa parece ser mais condescendo com este tipo de actividade. Com base na DUDA, no seu artigo 5º 4 se consagra o princípio que este tipo de actividade deve respeitar a dignidade do animal e não comportar qualquer violência sobre o mesmo.
É neste tópico de muito relevo a Lei nº92/95 de 12 de Setembro, sobre a proteção do animal. No seu artigo 1º número 1 começa por proibir todos os actos de violência injustificada sobre animais, concretizando esta regra nas várias alíneas seguintes. A alínea b) é referente a utilização de chicotes, agrilhoes ou outros instrumentos perfurantes sobre animais, exceptuando serem permitidos em touradas e na arte equestre. Não resistimos a confrontar a proibição da alínea d), a interdição de abandonar na via pública animais, restrição tão claramente não respeitada na nossa sociedade. A alínea e) sobre a utilização de animais para fins didácticos ou espectáculos, esta só a permitida na medida que não cause dor superior ao benéfico que se retira da actividade, com excepção das experiências científicas de comprovada necessidade. A alínea f) é a proibição de empregar animais em divertimentos que consistam no confronto mortal de animais contra outros animais, com excepção da caça.
O artigo 3º, tendo sofrido alterações pela Lei n.º 19/2002 de 31 de Julho, consagra que para a utilização de animais em espectáculos comerciais é necessária a autorização da Inspecção-geral das Actividades Culturais e do município onde o espectáculo é executado. Um dos problemas do Direito do Ambiente, da sua falta de efectividade é aqui claro, as sanções para violações destas normas são remetidas para lei especial, retirando objectividade ao diploma e dando origem a mais leis e regulamentos, que retiram também operacionalidade ao direito. É contudo de referir a nota positiva de que o artigo 10º, concede às associações zoófilas legitimidade para requerer as medidas para evitar violações destas normas, ficando até inclusive dispensadas do pagamento de custas e de impostos de justiça.
Ao terminar este estudo uma nota positiva. Pela Portaria nº1226/2009 de 12 de Outubro do Ministério do Ambiente, é proibida a detenção de espécimes vivos das espécies listadas na portaria, todos animais selvagens, não se aplicando esta restrição a jardins zoológicos, como é natural. O artigo 4º nos parece ainda assim o mais relevante, proibindo aos detentores, á data da entrada em vigor da portaria, destes animais listados a compra de novos exemplares, e também a reprodução destes. Esta última parte nos parece mais difícil de conseguir naturalmente, mas o fim é bom. Este é um bom travão na utilização de animais em circo e instituições do género, que muito sinceramente nos parece de aplaudir. Outro diploma muito relevante e positivo é ainda o Decreto-Lei nº260/2012 de 12 de Dezembro, que alterando vários diplomas, procedeu a um estabelecimento efectivo e extensivo das condições para manter e comercializar animais domésticos e selvagens, mais um passo relevante na proteção da dignidade animal.
Concluindo, parece ser a preocupação com a biodiversidade e com os animais selvagens, em cativeiro incluída, sempre concretizada numa proteção indirecta e sempre da espécie, e não com o animal individualmente considerado.

Bibliografia
ARÁUJO, Fernando, A hora dos direitos dos animais, Coimbra, Almedina, 2003;
COELHO, Pedro Filipe Félix, Diss. A protecção das espécies ameaçadas , Lisboa, 2002, Relatório de mestrado para a cadeira de Direito Internacional Público apresentado na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa;
COSTA, António Pereira da, Dos animais : o direito e os direitos, Coimbra, Coimbra Editora, 1998;
GODINHO, Helena Telino Neves, A tutela jurídica da fauna selvagem terrestre : uma abordagem comparada dos ordenamentos português e brasileiro, Curitiba, Juruá, 2011;
GOMES, Carla Amado, Introdução ao direito do ambiente, Lisboa, AAFDL, 2012;
RAMOS, José Luís Bonifácio, O animal : coisa ou tertium genus?, In: Estudos dedicados ao Professor Doutor Luís Alberto Carvalho Fernandes. - Lisboa, 2011. - Vol. 2, p. 221-256;
SILVA, Vasco Pereira da, Verde cor de direito : lições de direito do ambiente, Coimbra, Almedina, 2002.
Rafael José Esteves Atalaio, número de aluno 19819

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